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O episódio mais recente do Podcast do Transporte se dedica a explorar a trajetória e a relevância contemporânea da Tarifa Zero no sistema de transporte coletivo. Antes vista como uma ideia extremista ou utópica, esta proposta de gratuidade se consolida no debate nacional, angariando apoio de administrações municipais de diferentes espectros políticos e atraindo o interesse do Governo Federal.
Lucio Gregori, ex-secretário de transportes na gestão de Luiza Erundina em São Paulo, compartilha os desafios enfrentados nos anos 90. Ele reafirma que a Tarifa Zero é, essencialmente, uma discussão política que versa sobre a justa distribuição de recursos e o modelo de gestão das cidades.
Por sua vez, Ailton Brasiliense, presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), detalha as estratégias técnicas e as fontes de financiamento que podem tornar a implementação do modelo factível.
Daniel Santini, da Fundação Rosa Luxemburgo, expande a discussão, argumentando que a Tarifa Zero não se limita ao aspecto laboral, mas abrange o acesso à saúde, ao lazer e ao bem-estar social. Ele sugere a criação de um sistema de transporte público que seja prazeroso e promova a intermodalidade, incentivando deslocamentos mais leves e a pé. Santini também chama a atenção para a crise contínua no setor, em que a queda no número de passageiros persiste após o período pandêmico, gerando impactos negativos para toda a sociedade.
Mobilidade, gênero e o cuidado urbano
No podcast, Clareana Cunha, socióloga do Instituto Pólis, traz à luz uma perspectiva de gênero: a infraestrutura de transporte público foi historicamente pensada para o "homem provedor", negligenciando as viagens de cuidado, que são preponderantemente realizadas por mulheres. Ela defende a concepção de cidades feministas, com um planejamento de mobilidade que priorize o movimento de quem precisa levar crianças à escola, acompanhar idosos e acessar serviços essenciais. Na capital paulista, por exemplo, 62% dessas movimentações são femininas, e mais da metade delas são feitas exclusivamente a pé.
O tema ganhou destaque no “Arena ANTP”, que promoveu um painel focado em Tarifa Zero sob a ótica da saúde pública e do trabalho de cuidado. O debate ocorreu entre 28 e 30 de outubro de 2025, e foi mediado por Daniel Santini e contou com a participação de Letícia Cardoso (Ministério da Saúde), Kelly Cristina Augusto (GIZ), Lorena Freitas (ITDP) e Clareana Cunha (Instituto Pólis). O objetivo foi examinar como a Tarifa Zero pode ser uma ferramenta de justiça social, ampliando o acesso e gerando transformações positivas na vida das pessoas, especialmente no que se refere à saúde e às questões de gênero.
O futuro da eletromobilidade e novidades no setor
Em um bloco dedicado às inovações internacionais, Adamo Bazani, editor do Diário do Transporte, reporta os principais destaques da Busworld 2025, a maior feira global de ônibus, realizada em Bruxelas. O avanço da eletromobilidade nos veículos urbanos e intermunicipais é evidente, mas o segmento rodoviário de longa distância ainda enfrenta obstáculos técnicos. Alexandre Nogueira e Walter Barbosa, da Mercedes-Benz, explicam que a transição elétrica demanda soluções holísticas, que englobam desde o veículo até a infraestrutura da garagem, oferecendo serviços de consultoria e gerenciamento de baterias.
Além disso, Márcia Pinna, editora da Technibus, apresenta a chegada da Omio ao Brasil. Esta plataforma multimodal europeia, que já atende mais de um bilhão de clientes globalmente, iniciou operações com 300 viações nacionais, cobrindo 95% das rotas rodoviárias. O diretor Vitor Lalor ressalta o potencial do turismo interno e a importância da integração entre modais rodoviário e aéreo. A Omio busca consolidar-se como um parceiro estratégico, facilitando a aquisição de passagens rodoviárias, inclusive para turistas internacionais.
Editorial: o ônibus como elo social
Encerrando o episódio, Alexandre Pelegi convida à reflexão: a comparação entre viagens de avião e ônibus só é válida se a escolha for acessível a todos. Dados da PNAD Turismo 2024 revelam que, para a faixa de menor renda, o ônibus representa um quarto das viagens realizadas, enquanto o avião é quase irrelevante. Na faixa de maior renda, o avião predomina. O ônibus, apesar dos desafios como estradas precárias e concorrência irregular, permanece como o meio de conexão do "Brasil real". Ele não é apenas um transporte, mas o único que assegura a gratuidade para a população mais vulnerável, cumprindo um papel essencial no encontro e na mobilidade da nação.
Onde acompanhar o conteúdo completo
O Podcast do Transporte é uma iniciativa conjunta do Diário do Transporte, Technibus/OTM Editora e ANTP, com o patrocínio da Arena ANTP e Abrati, e apoio de empresas do setor.
Você pode se aprofundar em toda a análise e nas entrevistas completas, com novos episódios disponibilizados todas as quartas-feiras. O conteúdo está acessível em agregadores de podcast como o Spotify (para ouvir o episódio completo, acesse a plataforma oficial do podcast: podcastdotransporte.com.br/#ouvir) e no seu agregador de preferência.
Para uma experiência mais dinâmica, não deixe de conferir os cortes em vídeo e os destaques das entrevistas no canal do YouTube do Podcast do Transporte (www.youtube.com/@Podcastdotransporte).
Priorização do transporte coletivo
A implementação da Tarifa Zero no transporte público transcende a mera gratuidade e atua como um poderoso catalisador para o desenvolvimento urbano integrado e a otimização da mobilidade urbana como um todo.
Ao eliminar o custo direto da passagem, a política incentiva maciçamente o uso do transporte coletivo em detrimento do carro particular, resultando em uma imediata redução no congestionamento e, consequentemente, na diminuição da emissão de poluentes e do tempo perdido em deslocamentos. Essa mudança de modal não apenas torna as viagens mais rápidas e eficientes para todos — inclusive para aqueles que permanecem dirigindo —, mas também libera valioso espaço público que antes era consumido por vias exclusivas e estacionamentos, permitindo que as cidades priorizem o uso mais humano e produtivo do solo urbano, como a expansão de calçadas, ciclovias e áreas de lazer.
Do ponto de vista social e econômico, a Tarifa Zero funciona como uma política de redistribuição de renda de fato, pois devolve às famílias de baixa renda uma parcela significativa de seu orçamento que seria gasta em transporte. Isso aumenta o poder de compra local e a capacidade de acesso ao mercado de trabalho, saúde e educação, desburocratizando a logística urbana para o cidadão.
A facilitação do acesso, sem a barreira financeira, permite que o planejamento urbano se volte para a intermodalidade de maneira mais eficaz. O transporte coletivo passa a ser visto como a espinha dorsal gratuita da cidade, conectando-se harmoniosamente com o transporte ativo (caminhada e bicicleta) e outros serviços de mobilidade compartilhada.
Além disso, ao garantir que todos os cidadãos possam se mover livremente, a política promove a inclusão social e a vitalidade econômica de áreas periféricas, historicamente isoladas, incentivando a descentralização de serviços e a criação de novos pólos comerciais e culturais.
Em essência, a Tarifa Zero simplifica a mobilidade urbana ao remover a complexidade financeira e operacional da bilhetagem, permitindo que a cidade se concentre em aprimorar a frequência, a qualidade e a cobertura do serviço, transformando o transporte de um custo individual em um direito social fundamental e um investimento no futuro sustentável da metrópole.